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Janeiro branco: a importância do bem-estar emocional das mães atípicas

Foto de uma mãe sentada no chão sorrindo e segurando as mãos de seu filho com deficiência. Ao fundo vemos desfocado uma sala com decoração infantil

Estamos na última semana do mês de janeiro, que traz a importante campanha Janeiro Branco, cujo objetivo é conscientizar a população sobre a importância da saúde mental. E, apesar do mês estar chegando ao fim, o bem-estar emocional deve ser a prioridade da sociedade ao longo de todo o ano, principalmente no caso das mães atípicas.

Foto de Mariana segurando seu livro aberto

Pensando na importância da saúde mental dessas mães, é que a psicóloga e pedagoga Mariana Sotero Bonnás (@marianabonnas/), especialista no atendimento a mães atípicas e  fundadora do InPMA (Instituto de Psicologia da Maternidade Atípica), escreveu o livro “Mães atípicas: a maternidade que ninguém vê”, que está em pré-lançamento em plataformas digitais e cujo objetivo é acolher a mãe que vive uma maternidade muitas vezes romantizada e pouco assistida. A obra propõe ferramentas e reflexões para que a mulher encontre força e resiliência, além de apresentar maneiras para vivenciar momentos de felicidade genuína na sua trajetória. O lançamento oficial e presencial tem a previsão de acontecer em março em Bauru/SP e também na capital paulista. 

“As mães atípicas, na grande maioria, vivem totalmente sem apoio. Acabam carregando todas as responsabilidades, como diz o dito popular ‘Quem pariu Mateus, que o embale’, que pode ser compreendido como se a maternidade fosse apenas de responsabilidade da mãe, tirando-lhe até mesmo o direito de pedir e receber ajuda. Além disso, muitas mães não são percebidas; outras vivenciam momentos de tristeza, frustração, medos e culpa; outras ainda vivem em um constante luto pelo sonho do ‘filho desejado e ideal’ findar, de certa forma, com o diagnóstico de deficiência. Por isso, é fundamental ressaltar a importância da saúde mental e emocional, oferecermos ajuda e perceber os sinais do seu estado emocional, que podem indicar a exaustão em que se encontram”, salienta a psicóloga.

Ela destaca ainda que a questão não cabe somente às mães atípicas, mas à sociedade, de maneira geral: “Muitas vezes, essa mulher quer pedir ajuda, quer desabafar. Mas, quase sempre, as pessoas não querem ouvi-la, apenas dizem ‘confia, que vai dar tudo certo’, sem nem ao menos ouvir o que essa mãe tem para falar, como se fosse um corte na conversa. Além disso, em muitos casos, os familiares e amigos se afastam dessa mãe, justificam que é porque não sabem lidar ou cuidar da criança com deficiência, mas também nem perguntam como poderiam ajudar. Claro que não é obrigação das pessoas terem conhecimento sobre como lidar com a condição do filho, mas a ajuda pode ser muito mais simples do que se imagina”, ressalta a especialista, que ilustra com o seguinte exemplo: “Se o vizinho do prédio, quando for descer o lixo, perguntar a essa mãe se ela quer que ele desça o lixo dela também, já será uma ajuda muito relevante, principalmente no caso de filhos cadeirantes, que utilizam respirador ou outros recursos, que demandam toda uma manobra para que essa mãe consiga levar o lixo, pois, em muitos casos, a criança não pode ficar sozinha em nenhum momento. Ou seja, uma ajuda simples para quem oferece, mas de grande valia para as mães nessas condições. Outro exemplo é o vizinho, quando for à padaria ou ao mercado, perguntar se essa família precisa de algo”, explica Mariana.

A especialista destaca ainda que estudos revelam que muitos pais de crianças com deficiência abandonam a família quando recebem o diagnóstico, como diz uma pesquisa divulgada pelo Instituto Baresi em 2012: no Brasil, cerca de 78% dos pais abandonaram as mães de crianças com deficiência e doenças raras antes de os filhos completarem cinco anos. “Uma das principais justificativas é o fato deles não conseguirem suportar o ‘luto pela imagem criada do filho ideal’. E as mulheres que não foram abandonadas pelos parceiros, na maioria dos casos, têm a rotina bem mais sobrecarregada, pois, muitas vezes, os homens não se envolvem tanto com os cuidados com o filho”, salienta a psicóloga.

Ela complementa: “Sabemos que existem muitas mulheres que tiram a própria vida, como um caso que tive conhecimento que descobriram o ocorrido somente depois de cinco dias.  Ou seja: ninguém se preocupava com essa mãe, porque, normalmente, quando mandamos mensagem para alguém, se a resposta não vier no mesmo dia, já ficamos preocupados. E esse filho, quanto sofrimento para conseguir sobreviver sozinho por esse tempo todo! Mas, antes dessas mães cometerem o ato, elas mandam sinais, como falas: “me sinto exausta, não tenho ânimo pra nada, não aguento mais”, e comportamentais, como desânimo de não querer fazer mais algo que, antes da maternidade, ela gostava muito, como sair com as amigas, por exemplo. E, caso essas falas sejam contínuas por mais de 15 dias, é preciso que ela busque ajuda de um psicólogo urgente, pois, é muito provável que ela esteja caminhando para um transtorno mental depressivo”. 

Propósito de vida

Mariana Sotero Bonnás também é uma mãe atípica: seu filho Vitor, 13 anos, foi diagnosticado aos 9 anos de idade com TDAH e TOC, mas o seu propósito de vida de atender mães atípicas já vinha sendo traçado durante a faculdade, antes mesmo dela casar e vivenciar a maternidade: “Eu trabalhei com crianças com desenvolvimento atípico desde a época que estava na graduação e também na pós, em projetos, a convite da minha orientadora, onde eu atendia crianças com deficiência em clínica e em escolas. E eu sempre pensava e me preocupava com as mães, porque eu percebia que ninguém olhava para elas, ninguém perguntava como estavam, se precisavam de ajuda ou desabafar. E isso me incomodava, mas eu não sabia como ajudar, até porque não tinha tempo para conversar com as mães, já que o trabalho era focado nos filhos. Até que um dia uma mãe me perguntou se eu poderia atendê-la na clínica e então me deu um estalo de que era isso que seria o meu propósito de vida. Na época, eu trabalhava em uma escola como psicóloga e coordenadora de inclusão e, quando voltava para casa, jantava rapidamente para atender as mães. O volume de trabalho começou a crescer tanto que a minha saúde mental começou a ficar estafada e, então, precisei fazer uma escolha”, diz Mariana, que também cursou pedagogia e tem especializações em Terapia Comportamental e Cognitiva (USP), Psicologia e autismo (UNIARA) e em Educação Especial e Inclusiva (Faculdade de Educação São Luís).

Durante a pandemia, em meados de 2019, a especialista então tomou a decisão de focar no atendimento às mães: “Eu sabia que as crianças seriam bem atendidas por diversos profissionais qualificados e por isso me senti muito feliz em poder começar a me dedicar somente às mães atípicas. Durante todo esse tempo ouvi inúmeras histórias, tão singulares em sua jornada, mas com alguns pontos em comum, como a dificuldade de encontrar um novo caminho, de enxergar sua história com leveza e de acolher seus sentimentos, aceitá-los e então conseguir ser feliz novamente!”, salienta.

O estudo contínuo sobre as especificidades emocionais dessas mães, como a questão do ‘luto pelo filho sonhado e idealizado’, levou Mariana a conhecer a teoria da renomada psiquiatra suíça Elizabeth Kübler-Ross (1926-2004) sobre os cinco estágios do luto (The Five Stages of Grief): negação, raiva, negociação, depressão e aceitação. “A Elizabeth desenvolveu 10 fases, mas cinco foram as que se tornaram referência mundial. Observando os meus atendimentos e com base na teoria da Elizabeth, desenvolvi um protocolo de atendimento que chamo de acolhimento, onde adicionei mais duas fases ao entender que, no caso das mães atípicas, trata-se de um ciclo: de acordo com cada estágio de crescimento do filho, ela poderá revisitar diversos sentimentos dessas fases e, por isso, a importância de ter ferramentas apropriadas para que ela consiga lidar emocionalmente com cada uma de uma forma mais leve e menos intensa do que já experienciou”, destaca a psicóloga.

Segundo Mariana, nas sessões de terapia, as mulheres começam a ter clareza de seus outros papéis além do de mãe, que também precisam ser vistos e cuidados, como o de mulher, esposa, profissional, amiga, entre tantos outros. “Porque a mãe atípica não é feita somente da maternidade, ela é uma pessoa antes de tudo e olhar para a vida como um todo é super importante! E pode ser um desafio se reencontrar após a maternidade atípica, mas é muito possível e ela verá que é possível viver a vida de forma mais leve e feliz”.

Além da terapia individual semanal online, a psicóloga também atende mães atípicas em grupos, com duração em torno de três meses. Ela disponibiliza ainda o Desafio de 7 Dias, onde as mães recebem ferramentas necessárias para os desafios diários propostos. E, diante do aumento da demanda de psicólogos que pediam sua ajuda no atendimento a mães atípicas, Mariana criou também o curso online Psicologia da Maternidade Atípica, inédito para psicólogos que atendem ou têm interesse em atender mães de crianças com deficiência e querem aprimorar seus conhecimentos para fazerem um atendimento de excelência. “Segundo o IBGE de 2022, hoje no Brasil são mais de 16,8 milhões de pessoas com alguma deficiência, portanto são milhões de mães que precisam de um acompanhamento psicológico de qualidade para que possam vivenciar experiências e desafios diários com estratégias que sejam, de fato, efetivas. E ainda são raros os profissionais com capacitação no atendimento às mães atípicas, por isso, meu propósito é que, cada vez mais, os psicólogos sejam capacitados para que as mães tenham mais facilidade para encontrar profissionais especializados para atendê-las”.

Em relação à importância da saúde mental, em destaque na campanha Janeiro Branco, a psicóloga deixa a seguinte mensagem: “Mães, peçam ajuda! O ‘não’ vocês já têm! Muitas vezes, a mãe atípica acredita ser óbvio que precisa de ajuda, mas nem sempre quem está ao redor, como marido, amigos e familiares, sabem da sua necessidade de ser ajudada. Há ainda mulheres que sentem que estarão incomodando as pessoas se pedirem ajuda, mas é fundamental que você peça, principalmente se estiver se sentindo sobrecarregada e sem ânimo para a vida. Sugiro ainda que, caso esteja com os recursos financeiros limitados, busque as universidades de psicologia que, normalmente, têm atendimento a um preço acessível, supervisionados por professores ou coordenadores do curso. Eu tenho também uma rede de profissionais que cursaram meu curso voltado a psicólogos, onde trabalhamos com atendimento social, onde as mães são encaminhadas aos profissionais disponíveis. Ou seja: há diversas formas da mãe atípica ser ajudada, por isso, repito: peça ajuda!”

Saiba mais:

https://www.instagram.com/marianabonnas

https://www.instagram.com/institutopsimaternidadeatipica

Site: https://www.marianabonnas.com.br/

Livro: https://www.marianabonnas.com.br/livro-maes-atipicas

Atendimentos, cursos ou Desafios: (14) 3232-5777 (WhatsApp do InPMA)

Redação Civiam

Entrevistas, histórias reais e conteúdo sobre diversos aspectos ligados às Tecnologias Assistivas e à educação na saúde.

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