A situação pandêmica causada pela Covid-19 fez o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Coffito) publicar, no dia 20 de março, a Resolução nº 516, que permite temporariamente o teleatendimento por fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais. Entre as modalidades, estão a teleconsulta, que consiste na consulta clínica registrada e realizada à distância; o telemonitoramento, que é o acompanhamento também à distância de paciente atendido previamente de forma presencial por meio de aparelhos tecnológicos; e a teleconsultoria, que tem a finalidade de esclarecer dúvidas sobre procedimentos clínicos, ações de saúde e questões relativas ao processo de trabalho. Nesta modalidade, a comunicação é registrada e realizada entre profissionais, gestores e outros interessados da área de saúde e fundamentada em evidências clínico-científicas e em protocolos disponibilizados pelo Ministério da Saúde e pelas Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde.
Com o mesmo propósito, no dia 25 de março, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) também liberou a modalidade de teleatendimento e telemonitoramento temporário aos profissionais de Fonoaudiologia, em resposta à solicitação do Conselho Federal de Fonoaudiologia (CFFa) para atendimentos emergenciais ou considerados essenciais. A decisão amplia também os prazos de atendimento para 20 sessões (antes 10). No entanto, nada mudou para os pacientes enquadrados na Resolução Normativa ANS nº 259, que dispõe sobre a garantia de atendimento dos beneficiários de planos privados de assistência à saúde.
Tal medida também beneficia os Conselhos Profissionais de Medicina (CFM), Psicologia (CFP) e Nutricionistas (CFN).
Benefícios do teleatendimento
Segundo a fonoaudióloga Renata Giovannelli Carvalho*, especialista no atendimento a crianças com deficiências e comprometimento na fala, a liberação do atendimento à distância é fundamental para garantir, neste momento de isolamento social, a continuidade do programa estabelecido anteriormente com o profissional (fonoaudiólogo, terapeutas ocupacionais) e, assim, manter o progresso do tratamento do paciente. Além disso, ela ressalta que entre os principais benefícios dessa nova modalidade de atendimento está a maior interação com a família: “Em um atendimento presencial normalmente o paciente é acompanhado de apenas uma pessoa, como a mãe, por exemplo. Já no teleatendimento, todos os familiares estão no mesmo ambiente e acabam participando das atividades, o que estimula ainda mais o uso dos recursos de tecnologia assistiva por todos”, explica a fonoaudióloga.
Exemplo disso é o caso de Antonio, 12 anos, portador de paralisia cerebral com ausência de oralidade. Renata o atende há dois anos e agora, por conta da pandemia, faz o teleatendimento uma vez por semana em sessões de uma hora de duração. O horário foi combinado com a família para que a mãe e a irmã mais velha, de 15 anos, pudessem acompanhar o atendimento. A especialista utiliza recursos de Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA)/Comunicação Suplementar Alternativa (CSA)**, como o PODD (Pragmatic Organization Dynamic Display), uma metodologia de estimulação de comunicação baseada nas funções de linguagem do paciente).
Por meio de contação de histórias e atividades lúdicas, como uso de jogos, brincadeiras e música, a fonoaudióloga diz ser fundamental tornar o momento prazeroso e rico em aprendizagens de habilidades de comunicação para que paciente, familiares e cuidadores possam participar dessa nova rotina.
Na avaliação de Renata, o teleatendimento no tratamento do Antonio está sendo muito positivo: “A primeira parte da sessão é reservada para conversar sobre o que aconteceu durante a semana – momento em que todos da família fazem relatos e comentários por meio do Podd (Antonio adora isso!). E esse envolvimento permite ampliar o domínio de todos os familiares desse sistema de comunicação, o que é essencial para a evolução do Antonio. Discutimos e elaboramos novos caminhos do tratamento, ajustando para o que for mais útil e necessário no momento. Posso dizer com segurança que as interações em casa com o uso do Podd aumentaram substancialmente em número e em qualidade. Se não houvesse a opção do atendimento à distância, haveria, com certeza, prejuízo no desenvolvimento do Antonio, uma vez que, sem acompanhamento e sem orientação profissional, ficaria mais difícil a família saber como estimular a aprendizagem em casa e como utilizar os recursos de tecnologia assistiva já utilizados por ele em clínica”.
Adaptação às tecnologias para o teleatendimento
O teleatendimento trouxe um novo desafio aos profissionais, que precisam agora se adaptar rapidamente às plataformas on-line, como Zoom, Hangouts e Skype, que permitem o compartilhamento de imagens para o trabalho com as pranchas de comunicação.
Mas, segundo Renata, um ponto importante para o uso com eficiência das tecnologias é que o profissional se atente aos detalhes que essa nova modalidade de atendimento exige, pois no ambiente familiar os recursos podem ser mais limitados do que em uma consulta presencial: “é preciso compreender a rotina do paciente e saber quais materiais ele tem em casa e que podem ser utilizados. Precisamos ainda avaliar quais pessoas irão acompanhar o atendimento e assim pensar em atividades que envolvam todos, além de programações extras, caso alguma não flua como o planejado”, orienta a fonoaudióloga.
Futuro com o teleatendimento?
A especialista diz que acha importante que seja mantido o atendimento à distância quando a pandemia acabar, uma vez que favorece pacientes que não podem se locomover, estão internados em isolamento por questões de saúde ou que vivem em localidades onde não há clínicas especializadas no atendimento a pessoas com deficiência.
Mas, por outro lado, Renata acredita ser fundamental manter o atendimento presencial, pelo menos, uma vez ao mês. “A troca é mais rica – olhares, contato, expressões faciais, movimentos corporais, tudo isso é muito mais nítido e mais perceptível no atendimento presencial e, assim, fica mais fácil notar as sutilezas. O ideal seria manter as duas modalidades, pois uma complementa a outra”, explica.
*Renata Giovannelli Carvalho é fonoaudióloga e trabalha em um consultório e em uma escola para crianças com deficiência com pacientes e alunos com comprometimento na fala e na comunicação desde 2011 – U.E.P.A. (Unidade de Estimulação Pedagógica Alternativa) clínica e escola. Na área de educação, ela tem especialização em alfabetização pela Escola da Vila e cursos adicionais sobre currículos de Educação Infantil, inclusão, uso de recursos digitais e didática de Matemática. Renata atua em parceria com escolas, famílias e outros profissionais para pensar e favorecer a inclusão do aluno na escola regular e também atua como coordenadora em uma escola especializada. Além disso, estudou sobre linguagem, disfagia e comunicação alternativa. E atua na sua própria clínica.
**Nota: Há variações em relação à Comunicação Alternativa. Em algumas regiões, pesquisadores e profissionais utilizam CAA (Comunicação Alternativa e Ampliada), em outras, o termo mais usado é CSA (Comunicação Suplementar Alternativa). Por isso, consideramos todas as variações corretas.