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A importância da transdisciplinaridade nos atendimentos a pessoas com deficiência

Que o alinhamento entre diversos profissionais que atendem uma pessoa com deficiência é fundamental, não há dúvidas. No entanto, apesar de ser uma questão que, aparentemente, seria um consenso de todos os envolvidos, na prática, ainda traz diversos desafios que resultam em atraso no desenvolvimento do paciente ou, muitas vezes, até mesmo em um retrocesso. 

“É preciso que, constantemente, o tema seja destacado para que todos os profissionais de diversas áreas, como psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, médicos, profissionais da educação regular, assim como os da educação especial, entre outros, tenham a consciência de que o único objetivo comum de cada um tem que ser majoritariamente o desenvolvimento da pessoa que está sendo atendida. Por isso, é de suma importância a transdisciplinaridade entre as especialidades, que significa que cada um precisa ter uma noção de todas as áreas para que seu raciocínio durante um atendimento, dentro de sua especialidade, não seja isolado – o que prejudica o desenvolvimento no geral do paciente”, salienta Vanessa Gouvea, fonoaudióloga especialista em atendimento a pessoas com autismo, em Psicomotricidade, Bobath Pediátrico e Baby Comunicação Alternativa, uma das sócias da Pilar Terapias Integradas.

Segundo ela, o diálogo entre as especialidades deve acontecer constantemente: “É fundamental que todos os profissionais criem um canal de comunicação, porque toda informação, de todas as áreas, é extremamente importante e pode impactar em diversos fatores. Exemplo disso, é do caso de um paciente que tem autismo e que, com as nossas percepções aqui na clínica durante os atendimentos, conversamos com o médico psiquiatra que o atende e, após esse diálogo, ele fez ajustes tanto na medicação prescrita, como na dosagem”, exemplifica a fonoaudióloga.

 A psicóloga Natasha Bartowski, uma das sócias da Pilar Terapias Integradas, cita também outro caso de atendimento que, se não fosse tratado de forma transdisciplinar, teria uma evolução mais lenta e mais desafiadora: “É bastante comum em pessoas autistas a questão sensorial, como a de um paciente que atendemos que apresentava muita sensibilidade na cabeça e tinha dificuldade para cortar o cabelo, o que tornava a situação angustiante e gerando uma série de frustrações por não conseguir comunicar tal desconforto à família. Neste caso, a terapeuta ocupacional trabalhou o sensorial por meio de um brinquedo, que consiste em um boneco com cabelo de massinha, que cresce à medida que uma manivela é girada. Ao mesmo tempo, eu, como psicóloga, fui trabalhando as suas questões emocionais, como a frustração, e o comportamental; a Vanessa, como fonoaudióloga, a comunicação alternativa, por meio das palavras inerentes a esse processo, como lavar e cortar o cabelo, entre outros. Ou seja, o trabalho em conjunto é fundamental, ao potencializar o atendimento com estratégias mais assertivas na condução da questão como um todo”, ressalta Natasha.

Vanessa complementa: “E essa mesma criança, no contexto escolar, apresentava também dificuldades em desenhar ou escrever, o que a deixava ainda mais frustrada e, consequentemente, por não conseguir se comunicar, expressava-se batendo nos colegas da sala. Por isso, sempre ressalto: se a pessoa com deficiência está apresentando algum tipo de comportamento desafiador, isolamento, perder a vontade de ir para lugares que frequenta na rotina, entre outros, há algum motivo que precisa ser investigado por todos os demais profissionais, ao invés de afirmarem erroneamente que são comportamentos inerentes às pessoas com deficiência ”, ressalta a fonoaudióloga. 

É por isso que Vanessa destaca ser fundamental o conhecimento em Comunicação Alternativa pelos profissionais que atendem pessoas com deficiência e necessidades complexas de comunicação: “A comunicação é um direito de todos e deve ocorrer em todos os âmbitos. Dessa forma, todos os profissionais envolvidos no atendimento a uma pessoa com deficiência precisam conhecer a CAA para conseguir se comunicar com o paciente. Apesar de parecer uma questão óbvia, ainda encontramos muitos profissionais que não conhecem a CAA, o que é bastante preocupante em relação à qualidade dos atendimentos e, consequentemente, à evolução dos atendidos, pelo fato da comunicação permanecer estagnada”, salienta. Natasha complementa: “E a CAA é uma forma de organizar, de forma cognitiva, a comunicação da pessoa com dificuldades na fala, estimulando, assim, o desenvolvimento da sua própria forma de se comunicar, pois, nem sempre o sistema de comunicação alternativa contemplará tudo o que a pessoa quer dizer. Ou seja, a CAA atua ainda no raciocínio, ao fazer com que a pessoa pense em formas de expressar tudo o que deseja quando não há pictogramas correspondentes ao que quer comunicar. Além disso, é bastante comum os familiares serem surpreendidos com a CAA, ao notarem que as pessoas com deficiência têm conhecimentos que a família nem imaginava que poderiam ter”.

E, para que a transdisciplinaridade aconteça em todos os âmbitos, não apenas no ambiente clínico, Vanessa enfatiza a importância de todas as partes pensarem no grupo, no que é viável. “Ter bom senso do coletivo é fundamental, como, por exemplo, haver frequentemente diálogos entre escola, família e terapeutas que atendem o aluno com deficiência, além de ser essencial que os profissionais tenham espaço para sugerir à escola desde pequenas melhorias, como materiais adaptados (engrossadores de lápis, carteiras adaptadas, entre outros), até as consideradas mais complexas, como as adaptações de conteúdos ou, ainda, pensar em um plano estratégico para preparar a criança para o momento do aprendizado de determinados conteúdos. Exemplo disso é o caso de uma escola que nos deu acesso aos materiais do ano todo do nosso paciente e, dessa forma, estamos trabalhando no desenvolvimento das habilidades cognitivas e motoras para que ele consiga chegar a essas aulas de forma participativa e que consiga aprender os conteúdos que serão passados. Por isso, a contribuição de todos juntos é o fator primordial que possibilita que a transdisciplinaridade realmente aconteça”, explica Vanessa Gouvea.

Redação Civiam

Entrevistas, histórias reais e conteúdo sobre diversos aspectos ligados às Tecnologias Assistivas e à educação na saúde.

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