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De pai para profissional

A história desafiadora do musicoterapeuta Marcelo Cerrato

Foto de Marcelo com seu filho Rafael em uma sala cheia de instrumentos musicais. Rafael está sentado em uma cadeira baixa em frente a um teclado. Marcelo está em primeiro plano fazendo a self. Ambos estão sorrindo.

No dia 15 de setembro é celebrado o Dia do Musicoterapeuta, profissional que utiliza a música como ferramenta terapêutica para promover a saúde física e mental. A data foi escolhida em 1991, pelo então governador de São Paulo, Luiz Antônio Fleury Filho, que decretou a comemoração oficial.

Como forma de homenagear os musicoterapeutas, compartilhamos a história de vida de Marcelo Cerrato, que pelos caminhos desafiadores da vida, conheceu a musicoterapia por conta de seus três filhos autistas e acabou se apaixonando pela profissão. Assim, fez uma transição de carreira – ele era profissional de Tecnologia da Informação (TI), onde atuou por 27 anos, mas mal sabia ele que o seu destino já estava sendo desenhado para que pudesse, com a musicoterapia, transformar mais vidas, além da dos seus filhos.

Cerrato é pai de Lucas (23 anos, nível 1 de suporte), Rafael (19 anos, nível 3 de suporte) e Théo (completará 9 anos no dia 19/9, nível 2 de suporte): “O Rafael foi diagnosticado aos 2 anos de idade. Nessa época, o Lucas tinha de 6 para 7 anos e sempre foi uma criança funcional, falava tudo, conversava e não apresentava nada de atípico. Começou a apresentar questões de bullying na escola e situações de isolamento e comportamentos “sem filtro”. Após um tempo, de algumas trocas de escola e adaptações, suspeitamos do diagnóstico e fizemos a primeira avaliação neuropsicológica não fechando o diagnóstico de início. Um ano depois, dos 11 para 12 anos, o diagnóstico foi fechado por questões de dificuldades sociais. Já no caso do Théo, nós já tínhamos a probabilidade genética e desde o início o observamos, até que quando ele tinha aproximadamente 1 ano e 8 meses, identificamos alguns déficits de linguagem, que após a avaliação foi dado o diagnóstico de autismo”, explica.

A música sempre presente

“Eu sempre fui músico da noite e toquei na igreja por muitos anos. Sempre estimulei meus filhos à prática musical. Notei no Rafa uma identificação e encontrei nisso uma forma de ajudá-lo – assim conheci a Musicoterapia, que era uma das terapias que ele fazia. Após algumas pesquisas, em 2018 ingressei e cursei uma pós graduação na área, mas ainda trabalhava na área de TI, onde, durante as minhas férias, fiz estágio como musicoterapeuta durante a pandemia e me apaixonei pela profissão. A transição não foi planejada, foi ainda uma questão de necessidade, pois assim que me formei musicoterapeuta, em 2020, fui demitido no início de 2021 do emprego de TI e quatro dias depois já recebi propostas de trabalho. Abracei as oportunidades e assim iniciei na nova profissão”.

Cerrato fez ainda especializações em Vibroacústica e no Modelo Plurimodal de Musicoterapia, além de cursos de aprimoramento em TEA e Neurorreabilitação. Além da mudança profissional, uma trágica situação colocou novamente à prova a resiliência de Marcelo para seguir na nova jornada: no ano passado, a família passou por duas grandes perdas com o falecimento da sua mãe e, um mês depois, de sua esposa, Liliane Senhorini Cerrato, por complicações da dengue. Ela era ativista da causa autista, professora e estava à frente do perfil @somos_tea, com mais de 29 mil seguidores. “Foi um período muito difícil, como um “barco em alto mar”. Parei os trabalhos para dar suporte aos meus filhos. O Dr. Paulo Liberalesso e a Dra. Emília Gama, diretores do IEPSIS, organizaram um seminário denominado “Liliane, presente”, chamando vários profissionais para dar aulas voluntariamente e a renda foi revertida integralmente à minha família. Também destaco o projeto GAV Unindo Fronteiras, representado pelos colegas Musicoterapeutas Dr. Gustavo Gattino, Dr. Gustavo Araújo e Ms. Bruno Verga, onde os mesmos promoveram um curso de avaliação, com muitos participantes. O grupo Professores ABAixonados também realizou um curso nos mesmos moldes e as colegas Queila Oliveira e Rafaela Rodrigues também promoveram um curso de comunicação assistiva. Todas essas ações em prol da minha família me possibilitaram um grande alívio para poder cuidar dos meus filhos e sem essa preocupação financeira. Durante 11 meses consegui dar conta, mas precisei voltar ao trabalho aos poucos, pois a receita foi acabando e a vida precisou seguir naturalmente”, explica Cerrato, ao demonstrar tamanha gratidão ao apoio recebido nesse momento repleto de dor.

Hoje, o Musicoterapeuta trabalha na Kaya Life, em Alphaville, e na Clínica Pulsar, em Guarulhos, além de atender de forma particular (os interessados podem  entrar em contato direto pelo seu Instagram @marcelo_cerrato). Ele diz ainda que conciliar os dois trabalhos com a responsabilidade de pai solo de três jovens autistas tem sido desafiador: O que me ajuda é que tenho duas pessoas como rede de apoio, uma babá que está conosco há 20 anos e a tia dos meninos, que mora em um município distante. Mas, o meu filho mais velho é mais autônomo e, dentro de suas limitações, tem me ajudado nos cuidados com a  casa e com os irmãos”, diz.

Cerrato cita ainda que, em casa, também se dedica à estimulação musical ativa e receptiva com seus filhos por meio de canções de preferência e exploração dos instrumentos musicais. “Tenho um pequeno estúdio em casa. Não é um ‘processo musicoterapêutico’, mas os estímulos musicais têm trazido resultados importantes quanto ao desenvolvimento de cada um em relação aos níveis de atenção, coordenação motora, redução da hiperatividade, controle inibitório e socialização, entre outros”, salienta.

Ao Dia do Musicoterapeuta, ele ressalta: “Musicoterapia não é aula de música e não é recreação. É uma ciência, que exige estudo e qualificação; é uma profissão regulamentada que precisa, de fato, ser reconhecida como prática de saúde, tão importante quanto qualquer outra terapias e pode ser aplicada em diversos contextos. Por isso, é importante verificar o registro profissional de quem atende com a musicoterapia. Muitas clínicas hoje em dia têm músicos, mas muitos deles não têm a devida qualificação para o uso da música de forma terapêutica”.

Redação Civiam

Entrevistas, histórias reais e conteúdo sobre diversos aspectos ligados às Tecnologias Assistivas e à educação na saúde.

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