
O professor e especialista em tecnologias assistivas Mick Donegan, fundador e diretor da Special Effect Team, com sede no Reino Unido, que adapta gratuitamente controles de videogames e jogos de computador para que pessoas com deficiências tenham acesso à diversão, esteve no Brasil em dezembro passado para o lançamento do Instituto General Villas Bôas, em Brasília.
O time Civiam conversou com Donegan. Confira a entrevista:
C: Você é conhecido por conectar o lazer e a criatividade à comunicação para pessoas com deficiência através dos jogos. Como é esse processo?
MD: A maneira como trabalhamos é sempre focar nas necessidades do usuário. A pergunta simples que começamos é “Quais jogos você gostaria de jogar?”. Em seguida, trabalhamos com uma equipe multiprofissional com habilidades em terapia ocupacional, design de interface, educação, psicologia e conhecimentos técnicos, é claro. Usamos as habilidades de controle físico que o usuário possui, seja movimento da cabeça, movimento do pé, controle do olhar etc., ou qualquer combinação delas para garantir que a pessoa consiga jogar o jogo que deseja e que também seja possível na fase que se encontra. No entanto, este não é o fim da história. Com o tempo, as habilidades físicas dos usuários mudam, os jogos que eles querem jogar mudam e, é claro, a tecnologia de acesso muda. Por isso precisamos continuar e reavaliar as necessidades do usuário repetidas vezes. Fornecemos este serviço de suporte ao longo da vida a todos com quem trabalhamos.
C: Infelizmente, aqui no Brasil, os recursos de tecnologia assistiva não são acessíveis a todas as pessoas necessitadas. Como é essa realidade em seu país e o que você vê que poderia ser adaptado ou implementado no Brasil para melhorar essa realidade?
MD: Estou muito otimista com a disponibilidade de tecnologia assistiva para mais e mais pessoas no futuro. É muito encorajador ver o crescente número de recursos de acessibilidade nos principais sistemas operacionais, como iOS e Windows. Muitos desses recursos são realmente integrados e não têm custo extra para o usuário. Frequentemente, os recursos de acessibilidade estão disponíveis no software, mas o usuário simplesmente não sabe que eles estão lá ou como encontrá-los. Por exemplo, veja este vídeo de Colin, que controla um iPhone com apenas um único interruptor posicionado na parte de trás da cabeça.
C: Muitas famílias não estão preparadas e desconhecem os recursos de tecnologia assistiva do Brasil. Como você vê esse problema no resto do mundo? Na sua experiência, quais países têm famílias mais engajadas e preparadas para lidar com crianças com deficiência?
MD: Sim, de fato, em todo o mundo, muitas famílias e até mesmo profissionais, sejam de países ricos ou mais pobres, desconhecem quais recursos de tecnologia assistiva estão disponíveis para eles. A tecnologia assistiva nem sempre é cara. A vida de uma pessoa que não fala pode ser transformada simplesmente usando um pedaço de papel e um pouco de treinamento.
C: Na sua opinião, quais são os benefícios do uso de jogos no desenvolvimento cognitivo de pessoas com deficiência?
MD: Na minha experiência, os principais benefícios de permitir que alguém com deficiência física jogue videogame incluem: motivação aprimorada, oportunidade de competir, oportunidade de socializar jogando com os amigos, oportunidade de ser criativo e, acima de tudo, a oportunidade de inclusão.
C: O uso de jogos nas escolas como ferramenta de desenvolvimento cognitivo ainda é incipiente no Brasil. E Como é essa realidade no Reino Unido e na Europa: os jogos já estão sendo usados nas escolas?
MD: Embora os videogames não sejam amplamente utilizados nas escolas do Reino Unido, algumas delas estão começando a usar jogos como Nintendo Labo e Minecraft: edição educativa. São aplicados ainda em disciplinas como geografia, história, engenharia e física, entre outras atividades.
C: Que dicas você pode dar para famílias, professores e terapeutas que desejam encontrar a melhor maneira de oferecer CSA e lazer para seus filhos (com deficiência)? Qual é o principal ponto que eles devem olhar?
MD: Eu os aconselharia a procurar na internet, é claro, para descobrir sobre os recursos projetados para atender às suas necessidades particulares. Eu recomendaria que aqueles que estão trabalhando com pessoas com dificuldades de comunicação visitem o site da ISAAC e, em particular, entre em contato com a ISAAC Brasil.
http://www.isaacbrasil.org.br/
Para o lazer, um lugar para procurar é o ‘EyeGaze Games’, que, além de dar acesso controlado pelo olhar, também permite que as pessoas o acessem por meio de interruptores, joystick, mouse ou tela sensível ao toque.
https://www.specialeffect.org.uk/eye-gaze-games
C: Como foi sua experiência no Brasil?
MD: Absolutamente maravilhoso! Eu me sinto tão em casa no Brasil, que estava querendo voltar pra cá desde que vim a uma conferência em Natal, há 15 anos!
C: Como foi conversar com o público brasileiro no lançamento do Instituto General Villas Boas?
MD: Foi um privilégio estar lá e o público foi maravilhoso. Eu me senti privilegiado por estar em um evento que marca o início de algo muito especial para ajudar pessoas com deficiência em todo o Brasil.
C: Na sua opinião, o que podemos esperar nos próximos anos na evolução dos recursos assistivos?
MD: Sinto que uma maior acessibilidade será “incorporada” a cada vez mais dispositivos convencionais. Eu sinto que a vida das pessoas com deficiência não será melhorada apenas por um maior acesso a celulares, consoles e computadores, mas também pelo advento de dispositivos de “telepresença”, como os disponíveis na Double Robotics:
https://www.doublerobotics.com/
Também vejo suas vidas sendo aprimoradas por dispositivos de realidade aumentada, como os Hololens:
No entanto, no momento, esses dispositivos são caros, é claro, e, como eu disse anteriormente, há muita coisa que pode ser alcançada nos dispositivos existentes que, acredito, se tornarão cada vez mais acessíveis a todos. Você só precisa saber onde encontrá-los no seu próprio dispositivo!
Saiba mais sobre o Mick Donegan e a Special Effect Team: