Luciano de Almeida Moura mostra que, com determinação, é possível ir além das limitações
O mês de Outubro traz duas datas importantes: no dia 6 foi celebrado o Dia Mundial de Conscientização sobre a Paralisia Cerebral e, no dia 20, é comemorado o Dia Nacional da Paralisia Cerebral. O objetivo das celebrações é desmistificar o preconceito e salientar a importância da inclusão, além de discutir e promover os direitos das pessoas com paralisia cerebral para que tenham acesso à jornada escolar, profissional e social.
Por isso, compartilhamos a história de vida de Luciano de Almeida Moura, 37 anos (recém-completados no dia 8 de outubro): ele é exemplo de que as limitações ocasionadas pela paralisia cerebral não o impediram de se desenvolver em sua jornada escolar, tampouco na profissional: ele se formou em Tecnologia em Marketing pela UNIP e hoje concilia o trabalho na agência de marketing Quantik com o empreendedorismo da sua marca Luck Rock, que comercializa camisas, canecas, moletons, sacolas, bermudas e botons com estampas de sua autoria. Os produtos podem ser adquiridos pelo site Heart Merch ou na Galeria do Rock, localizada na Av. São João, 439 – 2º Andar, loja 372 (das 10h às 18h).
Comunicação Aumentativa e Alternativa
O jovem se comunica por meio da Comunicação Aumentativa e Alternativa (CAA), que conheceu aos 7 anos de idade na Associação Quero-Quero, por meio do Sistema Bliss que, segundo ele, “tornou-se a sua voz quando as palavras falhavam”. No entanto, ao perder a bolsa de estudo que tinha na Quero-Quero, teve que mudar de escola e ingressou na AACD (Associação de Assistência à Criança com Deficiência), que considerou o Bliss complexo demais, não dando continuidade ao seu uso pelo jovem.
Como já era alfabetizado, Luciano passou a utilizar o alfabeto impresso em uma prancha plastificada, a qual utiliza até hoje. Mas, foi na adolescência que, ao ingressar em uma escola regular, ele conheceu a fundo os desafios da inclusão da pessoa com deficiência. “Nem todos os meus colegas estavam prontos para estender a mão e me apoiar. Enfrentei olhares de desinteresse e até resistência, mas essas barreiras não me deteriam. Os professores também enfrentaram seus próprios desafios para se adaptarem à minha deficiência, alguns sentavam ao meu lado compartilhando suas lições, enquanto outros buscavam soluções criativas para que eu tivesse acesso ao conteúdo completo. Fiquei nessa escola até a sétima série, mas minha sede por conhecimentos continuava insaciável. Fui então para uma escola estadual com uma classe de 40 alunos e, aí, a busca pela inclusão tomou outras formas. Enfrentei muitas adversidades, principalmente com professores que resistiam à ideia de inclusão, sugerindo que eu procurasse um ambiente mais adequado às minhas necessidades”, salienta.
Mas, sendo a determinação uma característica da personalidade do jovem, Luciano utilizou a CAA para estabelecer conexões valiosas com colegas e até mesmo com alguns professores dispostos a quebrar barreiras. Luciano ressalta ainda a sua aprovação no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), cujas provas foram ampliadas para que pudesse realizá-las por meio do uso do alfabeto impresso, que o acompanha em todos os lugares para se comunicar. E, com a nota conquistada com louvor no Enem, ele recebeu uma bolsa de estudos para cursar o Ensino Superior na UNIP. “Não posso deixar de citar outro amigo, que se tornou um mentor pra mim: Bruno (Panda) e foi sob sua orientação que comecei a enxergar a importância do marketing como uma ferramenta para criar conexões e alcançar metas e a sua convicção inabalável em meu potencial me incentivou a buscar a faculdade, uma conquista que inicialmente parecia distante”. Conquista essa que se concretizou com a conclusão do curso de Tecnologia em Marketing (UNIP): “Optei por fazer faculdade online para evitar problemas de inclusão e deslocamento, o que foi uma decisão difícil, pois acabei perdendo a parte social que uma faculdade presencial oferece. No entanto, as provas eram presenciais e, felizmente, a equipe da faculdade foi extremamente inclusiva ao ampliá-las, aumentando o tempo para a realização das mesmas, além de adaptar o material para que eu pudesse enxergar melhor. Foi um período de muito esforço e disciplina, mas consegui concluir a faculdade de Tecnologia em Marketing!”, salienta.
Luciano enfatiza ainda a importância dos seus pais, Lourdes e Moura, em toda a sua jornada, aos quais demonstra imensa gratidão pela luta incansável de ambos ao lado do jovem por sua inclusão e melhor qualidade de vida. “Eles são a minha inspiração e o meu pilar. O amor de ambos é a luz que ilumina cada passo do meu caminho. Amo meus pais além das palavras!”, diz.
A paixão pelo rock
O nome da sua marca é também o apelido que amigos e familiares o chamam carinhosamente, já que ele é um apaixonado pelo rock: “Essa paixão teve início por volta dos 13 anos, no início da minha adolescência, quando a música “Mulher de Fases”, da banda Raimundos, estourou nas rádios. Ganhei de uma vizinha um CD da banda, e foi aí que me identifiquei profundamente com o estilo musical. Logo em seguida, passei a ouvir o CPM 22, admiração que cresceu ainda mais quando meus pais me levaram a um show da banda, no programa Bem Brasil, da TV Cultura, sendo o primeiro show da minha vida”, destaca. Ele salienta ainda: “Foi quando descobri a 89FM, a Rádio Rock, que minha vida mudou de verdade! Através da rádio, fui apresentado a diversas bandas e minha paixão pelo rock se consolidou de vez. Na época, enquanto estudava na AACD, pedi às voluntárias para levarem os alunos até a 89FM, onde tive a oportunidade de conhecer a locutora Luciana Salomão (Luka), que se tornou uma amiga querida. Mais tarde, naquele mesmo ano, participei de uma promoção da 89FM que me levou a um churrasco com a banda Charlie Brown Jr., onde tive o privilégio de conhecer pessoalmente o mestre Chorão. Esse encontro foi só o começo da minha jornada no rock, e ela ainda está longe de terminar!”, diz Luciano.
E a sua paixão pelo rock acabou sendo também a porta de entrada no meio profissional: quando tinha 17 anos, Leandro Pato, que era filho de um vizinho de Luciano, percebeu o talento do jovem e o convidou a trabalhar em uma produtora musical. “Ele viu além das minhas limitações físicas e reconheceu o meu potencial. E foi a partir desse encontro que uma nova fase da minha jornada começou, quando ele me convidou a trabalhar na Solar Music, uma oportunidade que transcendia as barreiras físicas graças à internet. Comecei a resenhar notas musicais, mergulhando de cabeça no mundo da música e da expressão artística. Permaneci lá durante seis meses e, então, quando tinha em torno de 20 anos, conheci a banda Fuzi Rock, que me convidou a trabalhar como divulgador da banda no MySpace. Cada nova pessoa que se conectava à música da Fuzi Rock me trazia um ganho merecido. Além disso, no trabalho com a banda fiz grandes amigos, que foram um diferencial em minha vida pessoal, como o Emerson, que se tornou um farol de inspiração, um irmão de alma que me mostrou que sou capaz de ser mais do que jamais imaginei. Sua presença em minha jornada é um testemunho da conexão humana e da capacidade de transformação que reside dentro de cada um de nós”, destaca Luciano.
O jovem já havia encerrado o trabalho com a Fuzi, quando, em meados de 2020, suas pinturas começaram a se destacar durante as aulas de pintura na Rede de Reabilitação Lucy Montoro. “Em meio aos rolês da vida, conheci o Rodrigo Fu, que se tornou um grande amigo. Ele tinha (e ainda tem) uma loja de roupas chamada Heart Merch. Um tempo depois, o Fu me convidou para estampar minhas pinturas e cedeu sua loja para vender meus produtos. Foi aí que, em 2021, a Luck Rock (@luckrockmarca) começou a tomar forma, unindo minha paixão pelo rock e pela arte. O logotipo foi inspirado na minha tatuagem, simbolizando essa conexão pessoal e reforçando a identidade única da marca”.
Apesar de ter uma jornada profissional bastante ativa, o jovem diz que enfrentou e enfrenta diversos desafios para ser contratado: “Mesmo passando nos testes online para ocupar as vagas, eu era excluído do processo seletivo assim que as empresas ficavam sabendo que eu não falo verbalmente. A grande maioria contrata pessoas com PC que conseguem falar”, destaca Luciano, que complementa: “Precisamos mudar urgente essa realidade, porque nós, pessoas com deficiência na fala e com mobilidade reduzida, temos a total capacidade de trabalhar e contribuir muito com a sociedade por meio do nosso trabalho, das nossas capacidades”.
O empreendedor trabalha desde 2020 na agência de Marketing Quantik, onde atua como copywriter. “A experiência tem sido incrível. Meu chefe Joel e meu colega de trabalho, Rafa, são sensacionais e me dão todo o suporte necessário. Minhas principais atividades incluem a criação de resumos de textos persuasivos para postagens nas redes sociais e também faço a coleta de dados para a “mailing list”, contribuindo para o marketing direto da agência. É um ambiente muito dinâmico, onde tenho a oportunidade de aprender e aplicar minhas habilidades diariamente!”, ressalta o profissional.
Luciano enfatiza ainda que conciliar o trabalho na Quantik com a produção dos produtos da sua marca, Luck Rock, é algo desafiador, porém, gratificante: “Eu organizo bem o meu tempo para conseguir cumprir as demandas de copywriting e coleta de dados na agência, onde trabalho quatro horas por dia, e reservo o restante do meu tempo para a criação e planejamento das estampas e produtos da minha marca. A sorte é que tanto na Quantik quanto na Luck Rock eu trabalho com criatividade, então, de certa forma, as duas atividades se complementam. Além disso, ter uma rotina organizada me ajuda a manter o foco e garantir que eu consiga equilibrar as responsabilidades de ambos os projetos”, complementa o empreendedor, que cita como suas bandas favoritas atualmente: CPM 22, Charlie Brown Jr., Dead Fish, Meu Funeral, Legião Urbana, Metallica, Nirvana, System of a Down e Rancore.
O jovem é também palestrante e, em muitos momentos da sua vida, frequentou diversos festivais – fato que o levou a atuar ainda na organização do ABC Pró HC, que celebrará 20 anos no dia 8/12, no Parque da Juventude em São Bernardo do Campo, em edição especial: ABC Pró HC XX/20 anos. “Nos anos 2000, esse festival era um dos principais da região, e eu frequentava todos os anos. No entanto, ele entrou em hiato por quase 8 anos. Durante a pandemia, enquanto navegava pelo Facebook, encontrei a página do festival e decidi entrar em contato com Fabiana Couto, a organizadora do evento. Após nossa conversa, fui convidado a integrar a equipe do festival, contribuindo bastante para a organização desse retorno tão esperado. Agora, o ABC Pró HC está de volta com um evento gratuito, e terei a honra de palestrar sobre acessibilidade. Vou compartilhar minha história de vida e destacar a importância da inclusão em eventos como esse. É uma oportunidade incrível de levar uma mensagem de conscientização e mostrar que acessibilidade é fundamental em todos os espaços, inclusive no universo dos festivais”. Ele ressalta ainda que palestrar para mais instituições de ensino, empresas e festivais é um dos seus sonhos a curto prazo. Os interessados em contratar suas palestras devem entrar em contato pelo WhatsApp: (11) 99988-3893.
Neste mês de conscientização sobre a Paralisia Cerebral, Luciano deixa a seguinte mensagem: “Gostaria de lembrar à sociedade que a inclusão começa com o respeito. Cada pessoa com PC tem capacidades únicas e sonhos a realizar. A paralisia cerebral não define quem somos, mas sim nossa força, resiliência e potencial. Para quem vive com PC, nunca deixe que suas limitações apaguem sua voz — seja na vida, no trabalho ou nos relacionamentos. Acredite sempre em suas possibilidades e continue lutando por um mundo mais acessível e justo”.
Confira ainda os vídeos que Luciano elabora com a ajuda da IA em seu instagram @luckrock e também as suas demais redes: https://taplink.cc/luckrock