Prof. Dr. Geraldo Peçanha de Almeida: pai atípico por escolha, amor por essência

O Dia dos Pais, celebrado em 10 de agosto, é um convite para homenagear aqueles que, com amor e presença, escolhem a missão de ser pai – um compromisso ainda mais profundo quando essa paternidade é dedicada a um filho adotivo com deficiências, como é o caso do professor Dr. Geraldo Peçanha de Almeida: ele é pai adotivo de Mateus, 15 anos, que tem Transtorno do Espectro Autista (TEA) nível 2 de suporte, Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), Transtorno Opositor Desafiador (TOD) e deficiência intelectual. Diariamente, ambos transformam os desafios em afeto, cuidado em esperança, e, assim, a paternidade de Geraldo torna-se um exemplo de coragem e amor.
Pedagogo, psicanalista, especialista em Educação Infantil, Pós-graduado em TEA, Mestre em Teoria Literária, Doutor em Crítica Literária, professor e escritor, formador de educadores e orientador de grupos e associações de pais de autistas, Almeida tem se tornado referência e inspiração a toda a sociedade sobre a verdadeira inclusão, educação e, principalmente, o real significado sobre o que é o amor. Ele já era pai adotivo de Bruno, hoje com 28 anos, quando adotou o Mateus. “Fui fazer um trabalho voluntário de motivação e acolhimento em um orfanato em Curitiba, com o intuito de contribuir com os profissionais a estarem mais próximos da garotada e compreenderem essa realidade. Nesse dia, as crianças tinham ido a um circo que estava na cidade e, enquanto eu aguardava em uma sala, o Mateus, à época com 9 anos, entrou e eu perguntei a uma pessoa o motivo dele não ter ido. Ela então me respondeu que ele tinha ‘problema na cabeça’ e que não sabia se comportar. Em menos de 10 dias, o Mateus estava passando o final de semana na minha casa e, dessa forma, começou o apadrinhamento afetivo – uma forma de oferecer apoio e convívio familiar a crianças e adolescentes que estão em situação de acolhimento institucional. É um programa que busca criar vínculos afetivos entre essas crianças e pessoas da comunidade que se dispõem a ser padrinhos e madrinhas, oferecendo-lhes atenção, cuidado e referência afetiva”, destaca o professor.
O processo de adoção de Mateus
No entanto, engana-se quem pensa ser simples o processo de adoção de uma criança com deficiência. Segundo ele, um dos principais empecilhos, além dos trâmites burocráticos inerentes ao processo de adoção, foi o capacitismo da sociedade ao enxergar Mateus como uma criança incapaz de ser adotada por conta dos diagnósticos. “A adoção é um processo muito cansativo para qualquer situação, mas adotar uma criança com deficiência por um pai solteiro é ainda maior, é muito desgastante. Além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) também não permitia a adoção por padrinhos afetivos – impedimento que derrubei entrando na justiça. Assim, entre idas e vindas de audiências inúmeras, o juiz perguntou o porquê de eu querer adotar o Mateus, que tinha tantos problemas, e eu o respondi: ‘Porque eu o amo’. E então o Juiz me retrucou: ‘Mas o amor acaba!’. Pensei mil coisas pra dizer a ele, mas permaneci em silêncio porque entendi, na hora, que se tratava dele. Ele falava por ele e por todas as dores que ele trazia. Então eu me limitei em dizer apenas: ‘Eu entendo, mas não concordo, porque na minha experiência de vida o amor não acaba. Eu tenho pais casados há 54 anos, nasci em um ambiente humilde, na zona rural, e, mesmo sem dinheiro, morando em uma casa desconfortável, sempre vivi cercado de muito amor, tolerância, compaixão e acolhimento. Para mim, o amor é infinito’. Ele, então, convocou meus pais para uma audiência online durante a pandemia e quando a câmera abriu e ele viu meus pais simples, humildes, quase analfabetos, ele ficou desconcertado. Fez duas perguntas quase sem sentido e 20 minutos depois a adoção estava publicada no site da justiça”, relembra emocionado.
Além dos diagnósticos, o professor também estava ciente dos demais cuidados que Mateus precisava, como os 12 medicamentos que ele toma diariamente, além de uma deficiência visual, que poderia evoluir para uma perda total da visão. Ele cita também que, por conta do autismo, Mateus apresentava uma hipersexualidade desafiadora. “Mas, em nenhum momento eu me senti acuado, pelo contrário: eu tinha a certeza do amor e do vínculo que eu podia construir com ele como pai e filho. Independente de ser pai biológico, o sentimento é inexplicável. Então, pra mim, o que existe é o amor na sua mais profunda pureza”, salienta Almeida, ao destacar também que o profundo conhecimento sobre as deficiências foi fundamental para que se sentisse apto a cuidar de Mateus: Geraldo tem 31 anos de experiência em educação de crianças e jovens e faz palestras em todo o Brasil. Fundou o Projeto Pólen, em Curitiba, no Paraná, do qual é diretor. Desde 2020 passou a integrar a Academia Internacional de Literatura Brasileira, com sede em Nova Iorque. É também responsável pela criação e implantação de Centros de Atendimento às Crianças e Jovens com Transtornos do Neurodesenvolvimento em diferentes municípios do Brasil, além de ser autor de trabalhos internacionais com professores e crianças na Alemanha, Itália, Áustria, Bolívia e no Japão. Implantou na África, em Moçambique, um Programa de Leitura e Escrita e fez ainda estudos de aperfeiçoamento em Educação Especial em Cuba.
É ainda autor de 77 livros, escritos ao longo de 30 anos, sobre os mais variados temas, como educação infantil, educação de filhos, autoconhecimento, literatura infantil e, o mais recente, sobre o autismo: “Para além do autismo: um guia prático para pais e educadores desenvolverem o cuidado”. Os interessados em adquirir as obras podem entrar em contato com o autor pelas redes sociais: @geraldopecanhadealmeida (Instagram) ou https://www.facebook.com/geraldopecanhadealmeida (Facebook).
Segundo o professor, a maior dificuldade hoje da paternidade atípica são os julgamentos externos dos comportamentos disruptivos: “Se o meu filho grita, pula, balança as mãos, se chacoalha o pescoço, as pessoas riem, humilham, fazem todo tipo de chacota e muitas pessoas verbalizam coisas horríveis. Mas, se isso é feito em outro ambiente, como em um estádio de futebol ou em qualquer outro lugar que as pessoas consideram normal se expressar corporalmente, ninguém liga. Então não é o comportamento disruptivo que incomoda, mas, sim, onde ele acontece – e não tem como prever onde tais comportamentos ocorrerão no caso dos autistas. Exemplo disso é no caso de fuga – os autistas podem fugir do pai e da mãe de dentro de uma loja e ir pra rua sem ver se tem carro passando. Os autistas podem estar numa boa e de repente se desorganizam, gritam, batem, falam palavrão e, obviamente, as pessoas não têm a menor paciência e tolerância para compreender esse tipo de comportamento”, destaca Almeida, que complementa: “Hoje o Mateus é mais adolescente e tais comportamentos desafiadores raramente acontecem. Mas, quando ocorrem é muito impactante, porque ele tem 1,83m de altura e uma voz potente – eu não fico desconfortável como pai, mas é notório que as pessoas não conseguem ainda compreender que os parâmetros para normalidade precisam ser revistos, uma vez que o mundo é de todos e as pessoas com deficiência também têm o seu lugar. Além disso, autismo acadêmico é muito diferente do autismo de quem convive com pessoas autistas dentro de casa”.

O professor menciona também: “O Mateus quer praticar esportes muito pesados, com muita adrenalina, que exigem muito do corpo e eu sempre foco em diminuir esses excessos. Mas, atribuo a questão muito mais à adolescência do que ao autismo em si”.
Comunicação: a chave das relações
“A comunicação é o ponto central do cuidado diário com a pessoa autista – comunicação, comunicação aumentativa, alternativa, diversificada – principalmente quando estão desregulados, ansiosos, silenciosos, quando não são verbais e em todos os sentidos – de manhã, de tarde, de noite, pelo olhar, pela fala, pela tonalidade, pelo movimento, pelo desconforto. Eu diria que se todo pai contemplasse mais o seu filho autista para perceber como ele se comunica e não como ele fala, a gente teria ambientes muito mais saudáveis para as pessoas com autismo”, ressalta Almeida.
O professor cita ainda como uma vitória dele e de seu filho, a aprovação da Lei Mateus Peçanha de Almeida no dia 11 de setembro de 2024, que garante trabalho aos adolescentes autistas. “Eu trabalhei arduamente escrevendo, discutindo e buscando viabilizações para que isso fosse possível. A deputada Iza Arruda, de Pernambuco, me incumbiu desse trabalho e o resultado da colaboração do grupo foi a vitória na Câmara e no Senado. Nem nos meus sonhos mais longevos eu poderia imaginar um momento como este. Para sempre na história do meu país, meu filho amado será lembrado não por suas deficiências, mas por ter trazido aos autistas jovens a esperança da dignidade. A Lei aprovada em relação ao Mateus também precisa de um foco, porque não basta somente uma lei, é preciso sensibilizar as pessoas, é necessário ocupar os espaços, é necessário esclarecer o que a lei faz, como, de fato, atua”, diz.
Ao mês dos Pais, o prof. dr. Geraldo Peçanha de Almeida deixa a seguinte mensagem: “Eu tenho muito medo dos pais que associam a deficiência à tristeza. A Dra Nise da Silveira, (médica psiquiatra brasileira que revolucionou o tratamento de doenças mentais no Brasil) dizia que alegria cura e eu lembro todo dia dessa frase. Pais de filhos com deficiência costumam ser muito pesados, tristes, taciturnos, associando esse estado de alma à deficiência e não é isso – as pessoas podem ser felizes, brincar, se divertir do modo que elas possam fazer, independente dos laudos e diagnósticos que carregam. Então, os pais muitas vezes cultivam essa melancolia, essa tristeza e não deveria ser assim – trancar os filhos e ficar acuados com eles. Proteger os filhos em excesso pode acabar limitando seu crescimento. Eles precisam ser fortes, explorar o mundo, caminhar na mata, correr nos parques, sentir a areia da praia nos pés, visitar sítios, fazendas e até um estádio de futebol. Onde houver curiosidade, deve haver espaço. Nossos filhos têm o direito de ocupar todos os lugares, de viver todas as experiências e de descobrir, por si mesmos, a riqueza que existe no mundo à sua volta. Por isso, nesse mês dos pais, eu gostaria de dizer: Pais, sejam felizes com seus filhos, independente dos adjetivos que eles tenham!”.

O professor ministra também cursos online por meio da Escola Geraldo Almeida: https://escolageraldoalmeida.com.br/home/. Entre os temas estão: “Como lidar com comportamentos agressores e desafiadores em TEA”, “Curso Intensivo sobre TOD”, “Teoria e Prática em Psicomotricidade”, “Curso PEI: Plano Educacional Individualizado 2025”, entre outros.
Confira: