As férias são sempre um momento bastante esperado e desejado pela criançada! Mas, segundo a Terapeuta Ocupacional Rayssa Beder*, as famílias que têm crianças com necessidades complexas de comunicação precisam se programar para o período, uma vez que muitas crianças pausam as terapias e permanecem mais tempo em casa. “Vale destacar que as férias começam antes mesmo das férias, porque é essencial que seja antecipado para a criança a chegada desse período de pausa. Como é um período que acaba trazendo mais tempo livre em casa para a criança, é importante pensar em como ficará a rotina durante essa pausa nas terapias e escola, como por exemplo, manter a estimulação do desenvolvimento global, que é essencial durante o dia a dia. Mas, vamos combinar que férias são férias não é mesmo?”, ressalta Rayssa.
Segundo a especialista, a primeira dica é como os pais ou adultos responsáveis pela criança vão olhar para o momento: “As atividades em casa precisam ser viáveis, com materiais já disponíveis e que envolvam o interesse da criança ou adolescente. É importante destacar que antes dos objetivos terapêuticos, o mais importante desse momento é o encontro com a criança, a construção de memórias afetivas e ambientes emocionalmente seguros nos quais a criança também tenha espaço de protagonismo, pois aqui o processo é bem mais relevante do que o produto final ou o brincar de maneira ‘correta’”, enfatiza a especialista.
Ela complementa: “A segunda dica é sobre onde procurar essas atividades e nesse ponto é essencial a participação da equipe dos profissionais que acompanham a criança com orientações e indicação de atividades a serem realizadas nas férias e que complementam as intervenções realizadas nas sessões terapêuticas. Geralmente atividades que envolvem recursos sensoriais como pintura, uso de materiais com texturas diferentes, colagem e têm como ponto em comum a confecção de um produto final são muito prazerosas e uma oportunidade de envolver a criança desde o planejamento do que será feito, dos materiais a serem usados, até o que será construído. Desse modo, uma mesma atividade pode ser dividida em dois dias da semana, por exemplo. Vale lembrar: o mais importante é o processo! As atividades com movimento, como boliche, jogo de argolas, circuitos motores também são indispensáveis e precisam ser pensadas para que a criança consiga participar observando as suas potencialidades e limitações funcionais. Por último, e também muito importante são os momentos em família como assistir um filme juntos e, novamente, podemos potencializar a participação da criança na escolha do filme e depois de assistirem todos juntos, uma conversa sobre o que ela mais gostou, pedir para fazer um desenho. Aqui vale a mesma ideia de dividir uma mesma atividade em partes para conseguir aproveitar o processo”, explica a Terapeuta Ocupacional.
No caso de viagens, Rayssa explica que o ideal é programar com antecedência, envolvendo a criança nesse processo de planejamento e na preparação de cada detalhe da viagem. “Por outro lado, se as viagens e grandes deslocamentos forem inviáveis, analisar as alternativas de passeios próximos como ida a parques, praças ou uso do próprio espaço domiciliar”, sugere.
A importância de aproveitar o momento com a criança
A especialista ressalta ainda que o primeiro cuidado para aproveitar ao máximo o período das férias é esquecer a hierarquia e, ao sentar com a criança, estar realmente disponível para o momento. “Brincar é uma atividade motivante, estimulante e vai além de apenas executar o que o adulto solicita. Outro ponto que precisa ser observado é se a sua criança consegue executar de maneira prazerosa a atividade proposta ou se o esforço físico ou cognitivo, por exemplo, é maior do que a capacidade atual da criança. É muito importante deixar claro que sempre é um trabalho de parceria do adulto com a criança, nunca de submissão da criança ao adulto”, orienta
Para as crianças que usam Sistemas de Comunicação Suplementar e Alternativa, Rayssa salienta que o espaço de fala é essencial: “Vamos partir do princípio que comunicação é troca entre duas pessoas sobre um determinado tema, então o cuidado para não sobrecarregar a criança de perguntas na tentativa de estabelecer uma comunicação é essencial. Do mesmo modo que criar ambientes favoráveis para essa troca é tão importante quanto e funciona muito mais do que as inúmeras perguntas em sequência. Reduzir as expectativas e investir no processo que acontece durante a interação com a criança é a chave para que a comunicação flua sem estressá-la, lembrando que estar em família é sobretudo celebrar o amor e a vida é um dos maiores exercícios de pertencimento que o ser humano experimenta em seu desenvolvimento!”, ressalta a especialista.
Rayssa destaca que as famílias devem ter atenção redobrada nas férias para o uso excessivo de telas de eletrônicos, como smartphones e tablets. “Reforço que brincar e jogar no celular de maneira isolada e sem propósito são atividades totalmente diferentes. Para além dos prejuízos cognitivos que o uso excessivo de telas acarreta, a literatura já aponta prejuízos no desenvolvimento afetivo e emocional de crianças e adolescentes. E ainda falando sobre superexposição, a qualidade das atividades a serem realizadas nas férias é muito mais importante do que a quantidade!”, reforça a Terapeuta Ocupacional.
Ela complementa: “Aproveite a companhia da sua criança, desfrute dos momentos, permita-se que o momento familiar seja divertido e reflita sobre tudo que sua criança é, que vai muito além de uma condição de saúde ou limitação funcional”.
*Rayssa Beder é Terapeuta Ocupacional pela Universidade Federal de Pernambuco, pós-graduanda em Neurorreabilitação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Realiza atendimentos clínicos junto a crianças e adolescentes com desenvolvimento atípico e oferece consultoria em inclusão escolar para famílias e instituições de ensino. É também revisora na COGNITIO consultoria científica, uma agência de consultoria em pesquisa científica para profissionais e periódicos científicos na área da saúde. É preceptora de estágio e colaboradora da disciplina Terapia Ocupacional na Infância da Universidade Federal de Pernambuco, ministra aulas e desenvolve estudos direcionados para o aperfeiçoamento de terapeutas ocupacionais nas linhas de pesquisa eye tracking, inclusão escolar, avaliação funcional do desenvolvimento infantil, reabilitação neurofuncional, estimulação cognitiva e jogos digitais.
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